Há hoje, dentro do imaginário da sociedade brasileira atual, certo
estereótipo arbitrário acerca da definição sobre “quem é” e “quem não é”
índio*. Esse estereótipo, surgido nos tempos coloniais e reforçado ao
longo da história, carrega consigo uma concepção de índio na qual alguns
de seus traços culturais foram selecionados pela sociedade nacional
como verdadeiros do ser indígena. Tais traços, enrijecidos no imaginário
brasileiro, identificam como índio apenas aquele indivíduo que mora em
aldeia e que se parece, nas suas representações estéticas, com um índio
de tempos passados.
Mas, por incrível que pareça, há também índios que vivem em cidades.
De acordo com o Censo 2010 do IBGE, mais de 324 mil indígenas (36% do
total) vivem em áreas urbanas no Brasil. Só em São Paulo vivem quase 12
mil – número que faz da capital paulista a primeira do país em número de
indígenas. São várias as etnias presentes na cidade: Maxacali,
Tubinambá, Xavante, Terena, Kaingang, Krenák, Kuruáya, Pataxó, Fulni-ô,
Pankararu, Pankararé, Kariri, Kariri-Xocó, Atikum, Xokléng, entre
outras.
A natureza da inserção do índio nas áreas urbanas pode ser entendida
por duas razões, entre as quais duas parecem se destacar. A primeira
envolve as terras indígenas que acabaram sendo inseridas na região
metropolitana devido ao crescimento da cidade. A segunda diz respeito à
migração de membros de povos indígenas de outras regiões do país para os
grandes centros urbanos em busca de melhores condições de vida. Este
fenômeno é bastante verificável em cidades como São Paulo, Manaus, Boa
Vista, Belém e Campo Grande.
A realidade, porém, mostra que a vida urbana acarreta em uma série de
dificuldades para os indígenas. Isto é o que se constata em quatro
aldeias indígenas guarani que estão no perímetro urbano de São Paulo.
Duas delas, chamadas Barragem e Krukutu, localizam-se no extremo sul da
cidade e possuem população de cerca de 850 guarani. As duas outras
aldeias, Tekoa Ytu e Tekoa Pyau, conhecidas como aldeias do Pico de
Jaraguá, estão localizadas na zona oeste da cidade, ao lado do Parque
Estadual do Jaraguá, e possui população de aproximadamente 600 guarani. A
realidade das quatro aldeias guarani na cidade aproxima-se muito da
realidade vivida pela população da periferia de um grande centro com
todas as suas mazelas (acesso limitado a serviços, como saúde e
educação, e condições inadequadas de moradia) acrescido, contudo, de
discriminação e do racismo construído historicamente contra essa
população.
Desta forma, a presença indígena nas cidades traz um duplo desafio. O
primeiro, referente à política indigenista é o de adequar o direito dos
povos indígenas de forma a contemplar essa realidade em meio urbano. O
segundo, referente à política urbana, é buscar formas de garantir a
diversidade no exercício do direito à cidade.
As políticas públicas para indígenas atualmente existentes estão
concentradas em algumas frentes temáticas, relacionadas principalmente a
questões de saúde, educação diferenciada e moradia. São, por vezes,
políticas que de fato satisfazem aos interesses desses povos e, mesmo
que ainda não suficientes em relação à demanda destas populações, e
elaboradas de forma não necessariamente participativa, são um
posicionamento político do Estado no reconhecimento da necessidade por
políticas sociais diferenciadas.
No entanto, as políticas públicas existentes possuem um traço
negativo em comum: a grande maioria não se estende aos indígenas que
vivem fora de Terra Indígena (TI) demarcada pelo Estado nacional.
Segundo o IBGE (2010), dos indígenas que vivem em área urbana, 92% vivem
fora de TI*. Dessa forma, a imensa maioria dos índios que vivem nas
cidades fica descoberta das políticas indigenistas do Estado devido ao
recorte territorial: estar ou não dentro de TI. Por mais que o Estado
brasileiro tenha avançado no reconhecimento da necessidade de construção
de políticas sociais diferenciadas para os povos indígenas, a questão
do “pré-requisito do território” é ainda um nó que precisa ser superado.
A demarcação da terra é de extrema importância para povos que
necessitam de uma medida que dê segurança sobre seus espaços
geográfico-cosmológicos, sendo estes um meio de afirmação de seus modos
de vida. Mas essa problemática, quando levada no contexto urbano, deve
ser analisada em toda a sua complexidade. É preciso levar em
consideração a realidade na qual os indígenas urbanos estão inseridos e
os motivos que os levaram à cidade ou os que fizeram a cidade chegar até
eles.
As autoras Andrezza Richter, Carolina Rocha Silva e Kárine Michelle Guirau fazem parte do projeto “A cidade como local de afirmação dos direitos indígenas” do Centro Gaspar Garcia de Direitos Humanos.
Fonte: Carta Capital.
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