O debate eleitoreiro em torno da água não vai resolver o assunto e
pode levar à opção do “quanto pior, melhor”, em detrimento do bem estar
de 20 milhões de pessoas no Sudeste.
A água não é política, água é um direito social e um insumo econômico
de primeira necessidade. Muitos negócios somente são possíveis porque
há água disponível. Até bem pouco tempo quando se falava em seca,
principalmente na mídia, era quase sempre na região conhecida como
semiárido nordestino, no Sul Maravilha a questão da água sempre foi
tratada como um problema de gestão e de engenharia. Pouco se fala da
necessidade de se “produzir água”, e isso não é um problema de
engenharia, mas de gestão de recursos naturais.
Os órgãos especializados na gestão de água e mananciais no Brasil,
como a Agência Nacional de Águas e diversas universidades vêm alertando
há alguns anos que a gestão de água no Brasil é casual, não é integrada e
não tem uma relação direta com a questão fundamental da produção da
água. O tema, aliás, é tratado por muitos engenheiros com certo desdém,
sob o argumento de que “não é possível produzir água”, afinal, ela cai
do céu. No entanto, o cuidado com rios e mananciais é fundamental para
que as empresas de captação e tratamento possam ter disponível água de
boa qualidade.
E mesmo a questão do “cair do céu” requer alguma atenção especial,
pois a água não é gerada no céu, verdadeiros rios aéreos circulam em
torno do planeta e, no Brasil especialmente, trazem água do Caribe,
reciclam sobre a Amazônia, chovem sobre o Pantanal e irrigam as lavouras
e as cidades do Sul/Sudeste. Há excelentes trabalhos realizados pelo
cientista Antônio Nobre, do INPE –Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais – e do INPA – Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia –
que mostram essa dinâmica em detalhes e porque se corre o risco de
transformar o clima da região de maior PIB do país em um deserto.
O tema produção de água esteve presente na discussão do Código
Florestal, aprovado em 2012, quando a redução das áreas de proteção às
margens de cursos d’água foi colocada como fator fundamental para o
aumento de produtividade nas propriedades rurais. Nessa época a
discussão ficou centrada em pode ou não pode, não se colocou de forma
incisiva a necessidade do pagamento por serviços ambientais que essas
áreas prestam à economia e à sociedade brasileira. Venceu o interesse
individual. Essas áreas deveriam ter sido tratadas como “produtoras de
água” e, portanto, remuneradas por isso.
Os mananciais mais prejudicados pela seca intensa que assola algumas
regiões do Brasil estão em São Paulo, onde há, ainda, a maior demanda
pelo recurso, seja no campo ou na cidade. A questão tem sido tratada de
forma partidária, principalmente pelo medo do atual governador candidato
à reeleição, Geraldo Alckmin, de um provável racionamento de água ser
utilizado na campanha, o que vai acontecer com certeza absoluta.
Deveríamos ir além dessa partidarização rasteira e analisar as propostas
concretas para a superação do problema em longo prazo.
Há algumas questões estruturais quando o tema é produção de água. A
primeira é entender que apesar de não se poder construir um “fábrica de
água”, é possível criar condições favoráveis para que o ciclo vital da
água se realize de forma mais intensa. Para isso é preciso recuperar e
preservar áreas de nascentes e proteger os cursos d’água com a ampliação
da cobertura florestal em suas margens o máximo possível.
Outra questão importante é entender que parte da “função social” da
terra é preservar os serviços ambientais por ela prestados. Assim, os
proprietários e produtores rurais devem fazer parte de uma grande rede
de produtores de água, capacitados, com tecnologia, assistência técnica e
os recursos necessários para a identificação de nascentes e cursos
d’água eventualmente secos pela derrubada da mata e implantação de
plantios ou pastagens, e a realização das ações necessárias para a
recuperação e preservação dessas fontes de água.
Produtores rurais também devem ser apoiados em ações que ajudem a
proteger os mananciais em sua propriedade ou adjacentes da contaminação
por qualquer tipo de produto químico utilizado nas lavouras ou com os
animais. Esses produtos quando levados aos rios são contaminantes de
alto impacto para a biodiversidade e torna o tratamento da água mais
caro.
Bom, mas como fazer com que essa rede de fato funcione? Isso não é
uma novidade, o pagamento por serviços ambientais, já bastante conhecido
pela sigla PSA, é um tema em discussão há muito tempo e já aplicado com
sucesso em diversas modalidades, inclusive na produção de água. Mas é
preciso uma Política de Estado para que ele seja visto como um
investimento fundamental para a segurança hídrica do país. E no caso
específico da região Sudeste, uma política universal instituída no
sistema de coleta, tratamento e distribuição de água.
Obras de engenharia podem ajudar a gestão da água pontualmente.
Um levantamento da Agência Nacional de Água (ANA), ainda em 2010,
apontou que o problema do abastecimento é generalizado pelo País. Dos
5.565 municípios brasileiros, mais da metade terão problemas de
abastecimento até 2015. E para tentar adiar o problema por ao menos uma
década será preciso desembolsar 22 bilhões de reais em obras de
infraestrutura, construção de sistemas de distribuição, novas estações
de tratamento e manutenção de redes muito antigas, que perdem mais de
30% da água tratada antes de chegar à casa dos clientes. Nesse valor não
estão incluídos os recursos necessários para resolver o problema do
saneamento básico, com a construção de sistemas de coleta de esgoto e
estações de tratamento, de forma a proteger os mananciais onde se faz a
captação para consumo humano. Para isso, segundo a ANA, serão
necessários outros 47,8 bilhões de reais.
O abastecimento das duas principais regiões metropolitanas do Brasil,
São Paulo e Rio de Janeiro, está ameaçado por conta da superutilização
dos mananciais, já bastante poluídos e degradados por conta da falta de
uma visão mais sistêmica, onde a preservação e a gestão devem caminhar
de mãos dadas. O sistema Cantareira tornou-se o vilão da hora para a
mídia, mas não é o único e talvez nem seja o principal. O sistema do
Paraíba do Sul, que alimenta o Vale do Paraíba e o Rio de Janeiro também
não suporta mais sua carga, com águas poluídas e margens devastadas.
O fato de não chover de forma regular em grande parte do Brasil, e
levar ao colapso sistemas de abastecimento, não significa que exista
menos água circulando pelo país. Acredita-se que a quantidade de água
que circula sobre o país seja basicamente a mesma de sempre, no entanto,
os desequilíbrios existentes nos ecossistemas faz com que o regime de
chuvas seja errático, por isso grandes enchentes em algumas regiões da
Amazônia, onde choveu a água que deveria ter caído mais ao Sul, e no Sul
do país, onde a chuva caiu antes de chegar à região Sudeste e
sobrecarregou os rios locais.
As políticas de gestão de recursos hídricos devem tomar vulto nas
próximas eleições em São Paulo, é preciso ir além das acusações e
discutir os modelos. Visão de gestão que inclua a recuperação ambiental
dos rios e mananciais do Estado, modelo de operação das empresas
concessionárias que disputam entre si para obter vantagens em captação e
não se responsabilizam de fato pelos investimentos necessários
emtratamento de esgotos e por ai vai.
No momento a crise hídrica paulista está em seu ponto alto, mas vai
voltar a chover. Pode-se esquecer do assunto atéa próxima seca (que virá
com toda a certeza) ou trabalhar para recuperar a capacidade de
produção de água dos biomas regionais e nacionais e manter os sistema de
abastecimento funcionando com conforto para a economia e para as
pessoas.
Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde e especialista em meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
Fonte:Envolverde
CEPRO –
Um Projeto de Cidadania, Educação e Cultura em Rio das Ostras.
Alameda
Casimiro de Abreu , n° 292, 3º andar, sala 02 - Bairro Nova Esperança - centro
Rio das Ostras
Tel.: (22) 2771-8256 e Cel 9807-3974
E-mail: cepro.rj@gmail.com
Blog: http://cepro-rj.blogspot.com/
Twitter: http://www.twitter.com/CEPRO_RJ
Rio das Ostras
Tel.: (22) 2771-8256 e Cel 9807-3974
E-mail: cepro.rj@gmail.com
Blog: http://cepro-rj.blogspot.com/
Twitter: http://www.twitter.com/CEPRO_RJ
Nenhum comentário:
Postar um comentário