segunda-feira, 30 de setembro de 2013

A pobreza diminui, mas a desigualdade aumenta


Enquanto governantes de 193 países avaliavam em Nova York os êxitos e fracassos dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), a Organização das Nações Unidas (ONU) deu uma boa notícia: a pobreza extrema diminuiu em todo o planeta para menos da metade. A proporção de pessoas que sobrevivem com menos de US$ 1,25 por dia caiu de 47%, em 1990, para 22%, em 2010, cinco anos antes do prazo para alcançar os ODM, segundo dados divulgados no dia 25 pela ONU.

Isto significa que cerca de 700 milhões de pessoas saíram da indigência. Grande parte desta redução ocorreu em países como Brasil, China e Índia, que têm grandes populações. Porém, ainda há 1,2 bilhão de pessoas vivendo na indigência nas nações mais pobres da África, Ásia, América Latina e Caribe. Uma das consequências imprevistas do alívio da pobreza foi o surgimento de uma nova classe média e de novas cobranças sociais, acompanhados de maciços protestos no Brasil, China, Egito, Índia, Tunísia e Turquia.

No entanto, esse avanço poderia ser detido logo pelos amplos efeitos da crise financeira mundial, com o colapso das moedas e a queda das exportações, alertaram especialistas. Martin Khor, diretor-executivo do South Centre, com sede em Genebra, acredita que a “erradicação da pobreza coincidiu com fatores globais excepcionais na primeira década deste século”. O auge do crédito nos países do Norte industrializado estimulou o comércio e o crescimento econômico nas nações do Sul, ao fortalecer as exportações de matérias-primas, explicou.

Os países em desenvolvimento também se recuperaram da crise financeira de 2008 e 2009, graças às políticas das nações ricas. “Mas as economias do Norte agora estão em problemas, já que adotaram medidas de austeridade, e a política monetária expansiva dos Estados Unidos deverá diminuir cedo ou tarde”, apontou Khor, ex-diretor da Rede do Terceiro Mundo, com sede em Penang, na Malásia. Os países em desenvolvimento agora são mais vulneráveis à queda das exportações e dos preços das matérias-primas, ressaltou à IPS.

Segundo Khor, nos próximos anos a desaceleração econômica e a possível recessão em alguns países, bem como a queda dos preços das matérias-primas, terão impacto nos empregos e na renda, novamente gerando pobreza. “Já está ocorrendo na Grécia, e pode acontecer em alguns países em desenvolvimento”, advertiu. Por sua vez, Winnie Byanyima, diretora-executiva da Oxfam International, disse à IPS que os ODM foram um importante motor para o desenvolvimento nos últimos 13 anos. “Tantas pessoas terem saído da pobreza em um período tão curto deve ser comemorado”, afirmou. Contudo, 1,2 bilhão de pessoas ainda sobrevivem com menos de US$ 1,25 por dia.

Byanyima apontou que os progressos são lentos ou inexistentes onde há conflitos prolongados ou onde o crescimento econômico não reduziu as desigualdades. “A pobreza mundial está caindo, mas em um país após outro a desigualdade está crescendo”, alertou. Milhares de milhões de pessoas ficam marginalizadas do crescimento econômico, afirmou. Há maior consenso quanto aos altos graus de desigualdade não serem moralmente objetáveis, mas que também afetam a estabilidade social e o próprio crescimento.

“Estes desafios devem ser enfrentados”, enfatizou Byanyima. Sem esforços concentrados para reduzir as brechas entre ricos e pobres, os próximos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), atualmente em discussão na ONU, serão inalcançáveis. “A grande omissão nos ODM foi não se focar em reduzir a desigualdade. Sem isto, a próxima série de metas para o desenvolvimento quase seguramente fracassará”, alertou, lembrando que é preciso uma meta individual de redução da desigualdade.

Sameer Dossani, coordenador da campanha Reconfigurando o Poder Mundial, na organização ActionAid, disse à IPS que, antes de tudo, a ONU deve adotar uma forma mais ampla de definir a pobreza, e não só considerar quantos dólares diários são necessários para sobreviver. “As raízes da crise global são as incríveis concentrações de riqueza e o fato de esse dinheiro não chegar” aos que mais precisam, afirmou.

 Uma das formas de abordar as desigualdades globais é a reforma do sistema fiscal internacional, ressaltou.

“Neste momento são perdidos pelo menos US$ 300 bilhões em arrecadação de impostos, que poderiam ser destinados ao desenvolvimento, pela combinação de incentivos fiscais e evasão de impostos por parte de corporações”, argumentou Dossani. No plano nacional, prosseguiu, os países devem se afastar das políticas de liberalização promovidas pelo Fundo Monetário Internacional e por outras instituições. No âmbito mundial, os governantes devem reformar os sistemas monetários para reduzir a dependência do dólar e assim garantir a estabilidade do sistema financeiro internacional, ressaltou.

O debate até agora evitou esses assuntos, que são fundamentais. Para que haja um genuíno contexto para o desenvolvimento, é preciso colocar no topo da agenda a reforma dos sistemas fiscais e monetários internacionais, opinou Dossani, lembrando que “esses temas não podem ser varridos para debaixo do tapete”. A declaração divulgada no dia 25 pelos governantes reunidos em Nova York diz que “Renovamos nosso compromisso com as metas e resolvemos intensificar todos os esforços para seu êxito em 2015”.

Essas metas incluem a erradicação da pobreza extrema e da fome, a universalização da educação primária, promoção da igualdade de gênero, redução da mortalidade infantil, melhoria da saúde materna, eliminação do HIV/aids, da malária e outras doenças, e a proteção do meio ambiente. Os chefes de Estado e de governo reunidos na sede da ONU para o 68º Período de Sessões da Assembleia Geral, se manifestaram preocupados pelos imensos desafios que ainda há pela frente.

“Decidimos que a agenda de desenvolvimento pós-2015 reforce o compromisso da comunidade internacional com a erradicação da pobreza e com o desenvolvimento sustentável”, diz o documento. Os governantes também decidiram iniciar um processo de negociações no começo do 69º Período de Sessões da Assembleia Geral, em setembro de 2014, “que leve à adoção da agenda pós-2015”. 

Fonte: Envolverde/IPS




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