Um comentário ao texto de Zander Navarro
Conheci Zander Navarro aqui na
CPT da Bahia, lá pelos anos 80. Era um pesquisador interessado em conhecer a
realidade do campo, particularmente dos trabalhadores. Vi o texto dele sobre a
agricultura brasileira publicado no Estadão (Pá de cal na reforma agrária) e
achei bastante interessante, embora tenha algumas leves divergências.
Aqui em casa a gente não come
soja. Também não chupamos cana. Não bebemos etanol. Esse lixo alimentar das
bolachinhas, biscoitinhos, etc., nem pago. Tampouco mascamos eucalipto. Também
não comemos galeto ou porco de granja, a não ser pelo castigo da ausência de
outro alimento. Aliás, até aí está um agricultor familiar como base produtiva
dos grandes frigoríficos.
Nossa comida ainda é o feijão
nordestino produzido pela agricultura de sequeiro do semiárido. Isto mesmo, até
na seca ele brota. Não pode faltar a farinha, embora esteja caríssima para um
alimento tão básico de nossa dieta cotidiana. A carne é de cabrito, ovelha –
famoso bode – ou galinha que vem das caatingas, sem antibiótico, hormônio, ou
outras mágicas do crescimento rápido. O peixe não é o de granja, a base da
ração purina, mas ainda o do São Francisco, tão dilapidado pelo agro e
hidronegócio. Sem falar que nossas verduras vem das hortas comunitárias, uma
grande criação de tantas associações de bairros e periferias.
Sim, infelizmente estamos
deixando de comer cuscuz, simplesmente porque agora nas embalagens da massa de
milho vem o "t” de transgênico. Aí não dá.
O agronegócio produz muita
riqueza. É verdade. Aqui, nas feiras de agricultura irrigada, tem muito trator,
implemento agrícola, tendas de venenos, outros insumos químicos e uma ou outra
caixa de fruta, que um ex-secretário de agricultura de Juazeiro chamava de
"frutas obesas”, por ter puramente água e nitrogênio. Se falarmos ainda no PIB
do agronegócio precisamos lembrar os aviões para jogar veneno nas plantas, mas
também nas águas e pessoas. Claro, cada avião precisa de um piloto. Ainda não
existe o drone do veneno, mas está aí uma sugestão.
Quando o pessoal que frequenta
a feira da irrigação tem fome, eles vão ao "bodódromo” em Petrolina. Ali tem
todo tipo de carne de ovelha e cabrito, com uma macaxeira frita, um feijão
tipicamente temperado. É uma festa.
Portanto, se o agronegócio se
extinguir, juro que não morreremos de fome e, talvez, a gente nem saiba que ele
morreu. Mas, se tirarem nossos pescadores, nossos criadores de bode, nossos
plantadores de feijão, nossos cultivadores de mandioca, nossos cultivadores de
hortas nas periferias, aí te garanto que o desastre é completo.
Portanto, bom proveito para
quem gosta do cardápio do agronegócio. Afinal, tem gosto prá tudo.
Fonte: Adital
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