Quem quer que se detenha hoje no noticiário sobre a política
brasileira e sobre a campanha eleitoral que se avizinha não terá como
escapar a certa perplexidade e a interrogações inquietadoras. Quando
nada, porque a situação parece indefinida.
As pesquisas sobre intenções de votos para a Presidência da República
sugerem um quadro ainda em mutação, quase volátil. Com a ocupante do
cargo em vantagem, mas com a oposição ainda sem saber com clareza para
onde vai – e se vai unida ou fragmentada, ou que consequências terá
sobre o eleitorado o início do julgamento do “mensalão mineiro”; se a
Justiça proibirá ou não doações de empresas para campanhas e quem mais
perderá ou ganhará com isso. Nesse panorama, o partido dominante no
poder leva vantagem – seja por dispor das “benesses” desse poder que
seduzem votantes, seja porque o “aparelhamento” nos cargos públicos
(fala-se em dezenas de milhares de partidários, talvez centenas de
milhares) facilita as ações.
Também nesse panorama, as perguntas são muitas. Começando, num âmbito
mais amplo, com as interrogações sobre o que acontecerá no País se
continuarem prevalecendo as graves questões do clima que nos assoberbam.
Seca mais prolongada, embora já seja a pior em muitas décadas? Com que
consequências nos reservatórios e no abastecimento de água? E no campo
da energia? Como isso se refletirá na avaliação dos candidatos?
Depois, cabe perguntar que rumo tomarão os chamados protestos de rua.
Que legislação vem por aí? Haverá proibição de “mascarados”, como quer o
governo federal, com prisão de até dez anos para eles? Mas com a Copa
do Mundo de Futebol se aproximando e 75,8% dos eleitores inconformados
com os custos gigantescos assumidos pelo governo (CNT, 19/2)?
Não é o único complicador. Também da área econômica vêm muitos
indicadores que sugerem prudência – PIB nacional em queda, redução nas
vendas de veículos (provavelmente com o maior endividamento dos setores
sociais “emergentes” internos), baixa nos índices de emprego no último
trimestre de 2013 e nos números de assentados em áreas rurais. As
notícias internacionais oscilam de rumo, ora com o Fundo Monetário
Internacional dizendo que “o crescimento global mantém o ritmo” (Estado,
20/2), ora com os Estados Unidos alertando para a “turbulência” nos
emergentes (22/2), que precisariam pôr “a casa em ordem”. As contas
correntes brasileiras registraram em janeiro o maior déficit mensal já
apurado – US$ 11,6 bilhões (Estado, 22/2). Internamente, diz o
ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues que “a lua de mel com o
Brasil acabou” e que é “cada vez mais forte entre empresários a ideia de
que o País será rebaixado pelas agências de rating” (13/2).
Teremos eleições com a economia em declínio? Que consequências daí
advirão – ainda mais com o governo federal anunciando (Folhapress, 21/2)
que realmente o crescimento do PIB será menor do que o estimado antes e
que fará um corte de R$ 44 bilhões nas despesas governamentais? Em que
áreas, com que reflexos no eleitorado?
Tudo isso vem num momento de alta turbulência internacional,
conflitos entre superpotências a respeito da Ucrânia, queda de mais um
governo no Egito, povo revoltado nas ruas da Indonésia, na Síria, na
Venezuela, até na Argentina – os dois últimos trazendo mais aflição ao
Brasil. Até na China, ferreamente controlada, se sucedem protestos em
Pequim e outras cidades, por causa da poluição do ar (FP, 25/2).
As rebeliões nas ruas demonstram mais uma vez que as mobilizações
sociais via redes na internet – sem projetos políticos específicos – têm
levado a fortes turbulências e até a mudanças de governos, sem que se
configure uma nova realidade política e social – como já se escreveu
neste espaço. E hoje é muito alta a porcentagem de eleitores nas nossas
redes. Para citar um caso, em Goiás mais de 40% deles participam de
alguma rede; entre jovens de 16 a 18 anos, são 80%; quase 40% têm renda
de até dois salários mínimos e 24%, mais de cinco salários mínimos (O
Popular, 24/2). Como se refletirão essas coisas entre eles, no País todo
ou num Estado onde o número de mandados de prisão por crime chega a 25
mil, o dobro da população carcerária?
A incerteza será maior ainda com a resolução do Tribunal Superior
Eleitoral (Agência O Globo, 14/1) que veda aos veículos de comunicação
“fazer enquetes ou sondagens sobre as eleições durante o período de
campanha; são proibidas as pesquisas de opinião pública sem registro
formal”. E a Justiça Eleitoral ainda poderá auditar “a qualquer tempo
equipamentos eletrônicos portáteis usados em pesquisas”. Nos dias de
eleição, resultados dessas sondagens só poderão ser divulgados depois de
encerrada a votação.
São muitas interrogações. Com a agravante maior de que os partidos no
poder não parecem empenhados numa plataforma eleitoral que traga um
diagnóstico da situação real do País e de suas questões mais graves. Da
mesma forma a oposição, que até aqui se limita a discursos vagos,
genéricos, sem enfrentar com clareza os problemas sociais de um país que
ainda tem muitos milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da miséria.
Com as cidades tumultuadas por indefinição em áreas como o transporte.
Sem legislação adequada para o adensamento urbano e o agravamento de
tudo ao seu redor. E muito mais.
Que se espera que aconteça? Que venham de fora soluções milagrosas?
Que a seleção de futebol seja a campeã do mundo e gere euforia interna
duradoura? Que tenhamos por aqui rumos diferentes dos que se veem nos
países convulsionados por mobilizações em redes incontroláveis? É
esperar demais.
Graves e imensas tarefas aguardam a comunicação – essencialmente, que
ela seja capaz de suprir informações indispensáveis à população e que a
esta permitam escolhas adequadas. Sem fugir às complexas questões
visíveis em toda parte.
Washington Novaes é jornalista.
Fonte:O Estado de S. Paulo.
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