De anos em anos vários dos mais renomados cientistas do clima
trabalham juntos no chamado Painel Intergovernamental de Mudanças
Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), com o intuito de expor para a
sociedade as mais recentes avaliações e análises científicas sobre os
avanços de medidas adotadas para a proteção do planeta e das gerações
futuras. Essa semana eles estão finalizando as últimas análises sobre
impactos das mudanças climáticas no Japão.
E você já deve ter pensado: ‘não estamos fazendo muito progresso nos anos recentes’. De fato, o
alerta da comunidade científica nunca foi tão claro. Se nós queremos
qualquer chance, minimamente realista de frear e parar as mudanças
climáticas nós
não apenas precisamos abandonar progressivamente os combustíveis
fósseis, mas temos também que proteger as florestas remanescentes pelo
mundo.
Os motivos para termos chegado nessa situação são relativamente simples – desmatamento, junto com mudanças climáticas formam um coquetel explosivo para o planeta.
Por quê? A ciência mostra que as mudanças climáticas podem gerar
períodos mais longos e intensos de seca, tornando florestas tropicais
ainda mais vulneráveis à queimadas. Acrescente as diversas formas de
desmatamento antes ou após uma grande queimada e você tem uma receita
pronta para o desastre. A derrubada de árvores fragmenta as
florestas sobreviventes, e estes ‘pedaços’ de floresta acabam virando
alvos fáceis de queimadas induzidas pelas secas.
As queimadas, por sua vez, acabam liberando grande quantidade de
carbono, acelerando ainda mais o processo de mudança climática. As
queimadas de grandes proporções que encobriram o céu da Indonésia e
países vizinhos no ano passado e levaram cinzas e poluição para os
grandes centros urbanos da região devem servir como exemplo de como
pode ser o ar que estaremos respirando em um futuro próximo, caso não
sejamos capazes de acabar com o desmatamento até o fim dessa década.
Colaborar do Greenpeace observa grande área de floresta
afetada por queimadas na Indonésia (© Ulet Infansasti / Greenpece).
Este ‘coquetel explosivo’ se torna ainda mais perigoso para a maior
das florestas tropicais remanescentes, a Amazônia. Na região, existe um
risco de que todo esse processo de fragmentação, vulnerabilidade e
queimadas levem a floresta para um ponto de inflexão, com consequências
desastrosas e irreversíveis.
A fórmula alterações climáticas + desmatamento pode transformar
rapidamente a floresta em savana, perdendo assim grande parte de sua
biodiversidade e, ao mesmo tempo liberando grande quantidade de carbono.
Entretanto, isso não precisa acontecer. Os cientistas hoje também nos
deixaram com uma ponta de esperança (ou com um grande sinal de alerta, a
depender do ponto de vista).
Por mais preocupante que este ponto de inflexão possa ser, nós
temos chances reais de evitar esse processo se formos capazes de manter
o aumento das temperaturas abaixo dos 2 graus celsius e prevenir a
fragmentação da floresta amazônica. Manter as florestas
tropicais intactas e sem fragmentações permite que elas mantenham sua
resiliência natural às mudanças climáticas.
Portanto, além de reduzir gradualmente as emissões por uso de
combustíveis fósseis, é preciso combater o desmatamento e conservar as
florestas tropicais primárias para que as
próximas gerações também tenham o privilégio de conviver com todas essas
paisagens e vida selvagem de tirar o fôlego que conhecemos hoje.
A nova evidência que pode ser incluída na análise do IPCC não apenas
descreve os já esperados impactos que a mudança climática terá nas
florestas, mas também destaca o que já estamos vivenciando. Um clima em
alteração coloca pressão adicional nas florestas e em seus ecossistemas.
Mudanças climáticas e queimadas não estão ameaçando apenas as florestas tropicais da Indonésia e a Amazônia nos anos recentes. A onda de calor na Rússia, em 2010, fez com que mais de 1 milhão de hectares de floresta boreal fossem devastadas. De acordo com o Banco Mundial,
eventos extremos como esse, e suas consequências dramáticas para as
florestas do planeta podem se tornar rotineiros, se não conseguirmos
parar com as alterações no clima.
Queimada atingindo floresta tropical na Indonésia (© Ulet Infansasti / Greenpece).
Para colocar as coisas sob uma perspectiva global, é importante
lembrar que o desmatamento é responsável por cerca de 12% do total de
emissões de gases do efeito estufa promovidas pelo homem. Em outras
palavras, o desmatamento causa emissões equivalentes a todos os carros, aviões, navios e trens do planeta, todos juntos.
Então, as florestas são um bom negócio. E fazem muito mais do que
emitir gases na atmosfera: elas também absorvem parte dos gases emitidos
pelos humanos. Isso quer dizer que desmatamento implica em prejuízo
dobrado – liberação de gases do efeito estufa na atmosfera
(principalmente dióxido de carbono) e redução da capacidade de absorção
desses gases emitidos por outras atividades humanas.
Mas a história não acaba aqui. Enquanto a proteção das florestas é
importante para a redução das emissões e no controle das mudanças
climáticas, as florestas também exercem um papel crucial ao
permitir que o mundo se adapte às consequências das mudanças que já
aconteceram e/ou vão acontecer, inevitavelmente.
Precisamos de florestas porque elas nos prestam serviços essenciais
como alimentos e matéria-prima, ou mesmo a regulação do fluxo de água
das chuvas. Nós precisamos disso tudo para nos adaptarmos a um clima em
alteração. Manter florestas intactas é uma das coisas mais importantes
que podemos fazer para tornar as diversas espécies capazes de se adaptar
e sobreviver junto com elas (dica: somos uma delas!).
O caminho que temos pela frente é um tanto óbvio. A ciência fez o
alerta sobre os fatos, em alto e bom som. Mas somos nós que devemos
agir: Somente se formos capazes de deixar o que sobrou dos combustíveis
fósseis debaixo da terra e ao mesmo tempo convencer governos e empresas como a Procter & Gamble
a parar de destruir as florestas tropicais remanescentes se
comprometendo com políticas de combate ao desmatamento, teremos chances
de salvar nosso clima e nosso planeta.
Dra. Janet Cotter é cientista sênior da Unidade de Ciências do Greenpeace Internacional
Sebastian Bock é consultor de políticas para florestas e clima, Você pode acompanhá-lo pelo twitter @sebastianbock
Fonte: greenpeace.org.br
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