Onde buscar o princípio articulador de outra sociabilidade, de novo sonho para frente?
Hoje vivemos uma crise dos fundamentos de nossa convivência pessoal,
nacional e mundial. Se olharmos a Terra como um todo, percebemos que
quase nada funciona a contento. A Terra está doente e muito doente.
E
como somos, enquanto humanos também Terra (homem vem de humus=terra
fértil), nos sentimos todos, de certa forma, doentes. A percepção que
temos é de que não podemos continuar nesse caminho, pois nos levará a um
abismo. Fomos tão insensatos nas últimas gerações que construímos o
princípio de auto-destruição. Não é fantasia holywoodiana. Temos
condições de destruir várias vezes a biosfera e impossibilitar o projeto
planetário humano. Desta vez não haverá uma arca de Noé que salve a
alguns e deixa perecer os demais. Os destinos da Terra e da humanidade
coincidem: ou nos salvamos juntos ou sucumbimos juntos.
Agora viramos todos filósofos, pois, nos perguntamos entre estarrecidos e perplexos: como chegamos a isso?
Como vamos sair desse impasse global? Que colaboração posso dar como pessoa individual?
Em primeiro lugar, há de se entender o eixo estruturador de nossas
sociedades hoje mundializadas, principal responsável por esse curso
perigoso. É o tipo de economia que inventamos. A economia é fundamental,
pois, ela é responsável pela produção e reprodução de nossa vida. O
tipo de economia vigente se monta sobre a troca competitiva. Tudo na
sociedade e na economia se concentra na troca. A troca aqui é
qualificada, é competitiva. Só o mais forte triunfa. Os outros ou se
agregam como sócios subalternos ou desaparecem. O resultado desta lógica
da competição de todos com todos é duplo: de um lado uma acumulação
fantástica de benefícios em poucos grupos e de outro, uma exclusão
fantástica da maioria das pessoas, dos grupos e das nações.
Atualmente, o grande crime da humanidade é o da exclusão social. Por
todas as partes reina fome crônica, aumento das doenças antes
erradicadas, depredação dos recursos limitados da natureza e um ambiente
geral de violência, de opressão e de guerra.
Mas reconheçamos: por séculos essa troca competitiva abrigava a
todos, bem ou mal, sob seu teto. Sua lógica agilizou todas as forças
produtivas e criou mil facilidades para a existência humana. Mas hoje,
as virtualidades deste tipo de economia estão se esgotando. A grande
maioria dos países e das pessoas não cabem mais sob seu teto. São
excluídos ou sócios menores e subalternos, como é o caso do Brasil.
Agora esse tipo de economia da troca competitiva se mostra altamente
destrutiva, onde quer que ela penetre e se imponha. Ela nos pode levar
ao destino dos dinossauros.
Ou mudamos ou morremos, essa é a alternativa. Onde buscar o princípio
articulador de uma outra sociabilidade, de um novo sonho para frente?
Em momentos de crise total precisamos consultar a fonte originária de
tudo, a natureza. Que ela nos ensina? Ela nos ensina, foi o que a
ciência já há um século identificou, que a lei básica do universo não é a
competição que divide e exclui, mas a cooperação que soma e inclui.
Todas as energias, todos os elementos, todos os seres vivos, desde as
bactérias e vírus até os seres mais complexos, somos
inter-retro-relacionados e, por isso, interdependentes. Uma teia de
conexões nos envolve por todos os lados, fazendo-nos seres cooperativos e
solidários. Quer queiramos ou não, pois essa é a lei do universo. Por
causa desta teia chegamos até aqui e poderemos ter futuro.
Aqui se encontra a saída para um novo sonho civilizatório e para um
futuro para as nossas sociedades: fazermos desta lei da natureza,
conscientemente, um projeto pessoal e coletivo, sermos seres
cooperativos.
Ao invés de troca competitiva onde só um ganha devemos
fortalecer a troca complementar e cooperativa, onde todos ganham.
Importa assumir, com absoluta seriedade, o princípio do prêmio de
economia John Nesh, cuja mente brilhante foi celebrada por um não menos
brilhante filme: o princípio ganha-ganha, onde todos saem beneficiados
sem haver perdedores.
Para conviver humanamente inventamos a economia, a política, a
cultura, a ética e a religião. Mas nos últimos séculos o fizemos sob a
inspiração da competição que gera o individualismo. Esse tempo acabou.
Agora temos que inaugurar a inspiração da cooperação que gera a
comunidade e a participação de todos em tudo o que interessa a todos.
Tais teses e pensamentos se encontram detalhados nesse brilhante
livro de Maurício Abdalla, O princípio da cooperação. Em busca de uma
nova racionalidade.
Se não fizermos essa conversão, preparemo-nos para o pior. Urge
começar com as revoluções moleculares. Comecemos por nós mesmos, sendo
seres cooperativos, solidários, com-passivos, simplesmente humanos. Com
isso definimos a direção certa. Nela há esperança e vida para nós e para
a Terra.
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