Primeiro foi
a terra. Os ingleses, em plena revolução industrial, inventaram o "enclousure”,
literalmente a terra "enclausurada”. Para quem conhece os meios religiosos,
sabe que clausura quer dizer cercado, isolado, só entra quem for o dono ou quem
for admitido. As terras comunitárias, da Igreja e dos reinados foram
transformadas em clausuras, isto é, propriedades particulares.
Trezentos
anos depois a propriedade particular da terra nos parece tão natural que
imaginamos ter sido eterna, como se fosse uma criação de Deus.
No final do
século passado começou a privatização das águas. Aqui há mais resistências,
guerras, como a de Cochabamba, retrocessos como a desprivatização dos serviços
de água na França, mas a ideologia privatizante da água segue caminhos
múltiplos, como a concessão de espelhos d’água no Brasil para fins de
aquicultura em plena era Lula.
Depois veio
o ar, com as fazendas de torres eólicas que se espalham aqui pelo Nordeste.
Enquanto na Europa as empresas requerem cerca de 20 m2 para
implantar uma torre, pagam bem por ela, sendo disputadas pela população, no
Brasil as empresas exigem 50 hectares de terra por torre e ainda pagam uma
mixaria para a população impactada pelas torres. Muita gente não entende a
resistência das populações a essas torres, mas se soubessem como é o processo
de implantação, logo mudariam de ideia.
Mas, como
previa Marx, o capital tende a transformar tudo em mercadoria. Agora é a
privatização do sol. Sonhávamos que no Nordeste Brasileiro, uma região
absolutamente energética, a tecnologia de captação da luz solar através de
placas nos telhados, imediatamente convertida em energia e despejada nas redes,
fosse um fator essencial de geração de renda para as famílias mais pobres,
agora transformadas em produtoras de energia, não mais dependentes do Bolsa
Família. Mas, para nossa surpresa, o governo brasileiro resistiu o quanto pode
a esse "novo modelo” e agora está começando a geração de energia solar através
de empresas privadas.
Então, aqui
na região, começou a privatização do sol. Áreas da caatinga serão desmatadas
–um km2– para dar lugar a usinas empresariais. Serão cercadas para
evitar os animais, particularmente os cabritos. Assim, serão criados
"enclousures solares” em pleno sertão, gerando renda fixa para as empresas
produtoras de energia, enquanto as pessoas e os bodes olharão de fora aquela
riqueza estranha em plena caatinga.
Esses são os
estadistas que nos governam.
Fonte: Adital
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