terça-feira, 25 de junho de 2013

No Brasil, 22% dos professores trabalham em mais de uma escola


Dados são do Censo Escolar de 2011; especialistas afirmam que rotina pode estafar docente.
Pouco mais de um quinto dos professores brasileiros trabalham em duas ou mais escolas de Educação Básica. Entre as regiões, Sul e Sudeste são as que apresentam os maiores percentuais: 25%.

Os dados são do Censo Escolar 2011, realizado anualmente pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e estão no Anuário Brasileiro da Educação Básica (para baixar, clique aqui).

Muitos são professores que lecionam, normalmente, em mais de uma rede, mesclando a municipal e a estadual ou uma pública com a particular. Há casos também de docentes que dão aula em uma unidade e são diretores em outra. As dificuldades impostas pelo trabalho em mais de uma unidade de ensino, independentemente do tipo de combinação, segundo especialistas, são diversas. A falta de tempo decorre de uma série de fatores que o trabalho em mais de uma unidade de ensino gera.

Deslocamento e qualidade de vida

Percorrer a distância entre uma escola e outra, seja de carro, seja de transporte público, pode ser complicado em grandes cidades e capitais. “O deslocamento em uma cidade como São Paulo, por exemplo, é muito difícil, independentemente do tipo de transporte que se usa. O trânsito é intenso.

É correr contra o tempo”, afirma Roberto Leão, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). “Não sobra tempo para nada e atividades como ler um livro, jornal e revistas se tornam raras. É contraproducente para a escola.”

Para ele, o professor deveria ter uma jornada que desse espaço para o preparo de uma boa aula. “No cenário ideal, não deveria ser necessário fazer malabarismos entre redes. A implementação da jornada do piso, que está na lei, já seria um começo”, diz Leão (para ler sobre a aprovação de um parecer sobre a jornada, clique aqui). “O cansaço é outro fator. Mais exausto, o professor tem pouca disposição para se atualizar e investir em formação continuada.”

A solução, segundo Anna Helena Altenfelder, superintendente do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), seria o fortalecimento de um regime de colaboração entre as escolas de um mesmo território, para que os professores dessem aula em unidades próximas. “Isso evitaria transtornos como o deslocamento, por exemplo”, afirma.

Vínculo

Escolas com equipes estáveis costumam ser benéficas para os professores, diretores, coordenadores e, principalmente, para os alunos, uma vez que é possível construir trabalhos em grupos com outros docentes e aperfeiçoar metodologias. Para pesquisadores da área, quanto mais tempo e convivência o educador tem com os alunos, melhor ele apreende o perfil deles e também da comunidade onde a escola está inserida.

“Na Educação Infantil, obviamente, e no Ensino Fundamental, é extremamente importante que se crie um vínculo entre o professor e os alunos. No início da escolarização, ele é a ponte entre a criança e o conhecimento, porque vai descortinar a relação dela com o estudo”, explica Cisele Ortiz, coordenadora adjunta no Instituto Avisa Lá, especializado na formação continuada de professores. “O favorecimento do aprendizado depende muito de como, de fato, esse professor vai se dedicar a cada criança.”

Segundo ela, um número muito grande de alunos, em diferentes turmas de diversas escolas, dificulta que o professor conheça e acompanhe todos em suas dificuldades. “Detectar o jeito de cada um demanda tempo e dedicação. Pois é preciso preparar melhor as aulas, pensando no tipo de didática que funciona melhor de acordo com a dinâmica de cada turma”, afirma Cisele.

Angela Dannemann, diretora-executiva da Fundação Victor Civita, acredita que não é necessário que o professor dê aula apenas em uma unidade. “Não podemos criar um contrassenso. É claro que uma rotina atribulada afeta a tarefa intelectual do professor, porque ‘pular de galho em galho’ não contribui para o seu trabalho, que é formar crianças e jovens”, afirma. “Mas não necessariamente precisamos disso agora. Há adaptações possíveis. O Ministério da Educação tem feito um grande esforço com programas como o Pibid (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência) e o Parfor (Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica) para aumentar a qualificação das licenciaturas.”

Segundo ela, a criação de grupos interdisciplinares nas escolas, que funcionassem no contraturno e envolvessem docentes de várias disciplinas, seria uma opção para manter o professor que tem poucas turmas por conta do currículo fragmentado (caso de sociologia, por exemplo) por mais tempo na escola.

Colegas

Para Anna Helena, do Cenpec, lecionar em várias unidades de ensino pode prejudicar o relacionamento do docente com a equipe pedagógica das escolas. “Fica difícil para os diretores reunirem todos os professores quando necessário. É um impeditivo para o professor se envolver plenamente no projeto pedagógico da escola. O trabalho é coletivo. Fica faltando integração com colegas, em reuniões pedagógicas e no HTPC (horário de trabalho pedagógico coletivo), por exemplo”, explica.

Apesar de achar ideal que o docente trabalhe apenas em uma escola, ela reconhece que, no caso do Ensino Fundamental II e principalmente do Ensino Médio, o currículo extremamente fragmentado, com algumas aulas ocupando apenas um espaço na grade semanal de cada turma, é um problema de difícil solução.
“No Fundamental I é mais fácil fixar o professor. Mas no caso dos anos finais, em aulas como sociologia e artes, o professor dá no máximo duas aulas para cada classe. Não tem aula para dar a semana toda”, explica. “Assim, só entra na escola para dar aquelas aulas e pronto. É como se estivesse de passagem.”




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