Superar o analfabetismo nas comunidades rurais no país ainda
é um dos principais desafios para os movimentos de trabalhadores do
campo brasileiro. A afirmação foi feita hoje (21) pela integrante da Via
Campesina no Ceará, Maria de Jesus dos Santos, durante palestra no
segundo dia do Encontro Unitário dos Trabalhadores, Trabalhadoras e
Povos do Campo, das Águas e das Florestas, que ocorre em Brasília até
amanhã.
Segundo Maria, que citou dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), dos cerca de 14 milhões de analfabetos existentes no
país, quase 5 milhões são camponeses.
“O analfabetismo no Brasil não está presente entre os grandes
latifundiários, entre os comerciantes, os industriais ou os empresários,
mas entre os trabalhadores. É uma questão de classe e precisa ser nossa
grande prioridade. Nas comunidades onde o analfabetismo é forte, é mais
fácil haver manipulação, a organização é mais difícil e os
trabalhadores assumem uma postura de subalternos”, disse.
Maria também defendeu uma maior participação dos movimentos camponeses
na formulação das políticas públicas de educação específicas para essa
parcela de brasileiros. “Não queremos ser só beneficiários ou
público-alvo, mas sujeitos nessas políticas”, acrescentou.
A integrante da Via Campesina avalia que houve avanços nos últimos
anos, como o lançamento das Diretrizes Nacionais para a Educação Básica
nas Escolas do Campo, pelo Conselho Nacional de Educação, além da
criação das bases para a instituição da Política Nacional de Educação no
Campo, por meio de decreto presidencial, em 2010, mas criticou o
conceito adotado no Brasil de levar à área rural uma “escola
assistencialista, precária e associada aos interesses do latifúndio, sem
reconhecer e valorizar a localidade onde está inserida”.
“O projeto de educação no campo deve ser enraizado nos interesses das
organizações camponesas, baseada na agricultura familiar e nos seus
variados modos de vida. As escolas indígenas têm que ter sua cultura, as
quilombolas têm que ter sua história, sua tradição, e as camponesas, os
valores de seus movimentos”, diz.
Divina Lopes, integrante do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST)
do Maranhão, que também participa do encontro, disse que a formação dos
professores que trabalham nas escolas do campo precisa ser específica.
Segundo ela, além de enfrentar infraestrutura insuficiente em diversas
unidades, os alunos, em muitos casos, não têm os saberes e as
experiências locais incluídos no processo de ensino.
“Muitas escolas da zona rural na minha região ainda são de pau a pique.
Além disso, em muitas delas, as experiências voltadas para o campo são
deixadas de lado, o que compromete a valorização da história e da
experiência camponesa”, lamentou.
José Wilson, secretário de Políticas Sociais da Confederação Nacional
dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), disse que uma escola de
qualidade ajuda a fixar os trabalhadores no campo, permitindo que eles
identifiquem oportunidades e potencialidades.
“A escola que a gente quer mantém o povo, inclusive o jovem, no campo,
porque lhe confere condições de promover seu próprio sustento, sua vida
com dignidade nesse espaço. Quando a educação dialoga com a realidade
local, as raízes, os hábitos, os saberes e as vivências que já existem
em determinada região, ela facilita o aprendizado e contribui para um
melhor desempenho das atividades no campo”, disse.
De acordo com o representante da Contag, um exemplo seria a inclusão de
técnicas de convivência com a seca, como estratégias de captação de
água da chuva e plantio de espécies adaptadas ao clima nas escolas da
região do semi-árido.
“Por isso, a educação no campo não pode ser pensada universalmente,
mas regionalmente para que sejam levadas em consideração as necessidades
de cada lugar”, defendeu.
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