Com a campanha para a Presidência da República ainda em andamento, é
difícil antever o panorama econômico e social para o Brasil em 2015 e
ações que serão desenvolvidas capazes de alterar o quadro. Porque neste
momento são muitas as incógnitas e os fatores presentes.
Que se fará aqui, por exemplo, diante de um panorama econômico
internacional que prenuncia crescimento mais consistente quase apenas
para os Estados Unidos – e até a China arrefecendo sua taxa de
crescimento, a Europa em dificuldades, parceiros comerciais como
Argentina e Venezuela diante de problemas muito fortes? Estamos com as
exportações em baixa em várias áreas, a indústria automobilística com
quedas de produção, nossas exportações de produtos industrializados de
menor valor sofrendo a concorrência asiática. Ainda será preciso
considerar um fator hoje praticamente difícil de avaliar, que é o do
clima. Afetará a produção em 2015 de nossos principais produto de
exportação, como grãos e outros itens da pauta de primários?
Até aqui, embora com as taxas de crescimento econômico no País em
forte baixa, o panorama socioeconômico tem-se sustentado nos índices
favoráveis de emprego nos níveis salariais menores. Continuará assim? É
interessante tomar conhecimento de trabalhos acadêmicos que estão no
último número (81) da revista Estudos Avançados, da USP, quase todo ele
dedicado a visões sobre trabalho, emprego e renda. E ali vale a pena
ler, entre muitos outros igualmente relevantes, o texto Baixo
crescimento econômico e melhora do mercado de trabalho – como entender a
aparente contradição, do professor João Saboia, do Instituto de
Economia da UFRJ.
Começa ele afirmando que a fase de baixo crescimento da economia
entre nós “provavelmente permanecerá pelos próximos anos”. Mas o mercado
de trabalho “tem apresentado resultados bastante satisfatórios”, com a
taxa de desemprego em trajetória descendente e o nível de renda da
população crescendo, assim como a formalização do mercado de trabalho,
ainda em elevação. Dados do Ministério do Trabalho e Emprego (Caged)
dizem que na década entre 2004 a 2013 foram gerados 13,4 milhões de
empregos. No triênio 2011-2013, já com a economia em desaceleração,
foram 3,2 milhões de novos empregos no total.
O quadro, porém, é diferente quando se observa a criação líquida de
empregos nos mesmos três anos, que ficou concentrada na faixa até dois
salários mínimos – a partir dela houve redução dos empregos. Hoje se vê
que a taxa de desemprego está em torno de 5%, mas “ela é levantada em
apenas seis regiões metropolitanas, deixando de fora a maior parte do
mercado de trabalho”. Outras fontes apontam taxas mais altas. A baixa
taxa “ocorre simultaneamente com alta precariedade e informalidade no
mercado de trabalho” – alto número de pessoas ocupadas com baixos
salários, sem carteira assinada e sem contribuição previdenciária ou
trabalhando por conta própria. E ainda com “baixo nível de produtividade
de tais empregos”.
Apesar dos avanços, diz o professor Saboia, “a situação permanece
bastante precária”, pois se pode imaginar o que acontece fora das seis
regiões metropolitanas – já que mesmo nestas apenas 55% dos ocupados têm
carteira de trabalho assinada. O País pode até – acredita ele –
continuar gerando empregos nos próximos anos, apesar das perspectivas
econômicas desfavoráveis. Mas serão ocupações com alto nível de
qualificação “ou, ao contrário, empregos de baixo salário e
produtividade”? Como três em quatro empregos gerados o têm sido no setor
terciário (dois em serviços e um no comércio), no qual a característica
tem sido baixos salários e baixa produtividade, é possível que se
continue nessa trajetória. E lembrando ainda que o crescimento da
produtividade no trabalho entre nós não passou de 1% ao ano entre 2000 e
2012.
Por isso tudo, a conclusão do autor do estudo é de que “o desafio que
se coloca para o País não é a geração de empregos, mas, sim, a geração
de bons empregos – isso passa por retomada de investimentos e pela
qualidade do ensino público em geral”. Ainda temos, segundo o IBGE, 13
milhões de analfabetos (Miriam Leitão, 19/9), mas “há um porcentual
menor de jovens entrando no mercado de trabalho”, e “com mais gente na
porta de saída, até porque o Brasil é um país onde há muita
aposentadoria precoce”. Como lembra o ex-ministro Pedro Malan, poderemos
até ter problemas com a oferta de mão de obra (Estado, 9/3). A partir
de agora, “o crescimento da população ativa garante pouco mais do que um
ponto porcentual de crescimento do produto interno bruto. Como mostram
vários estudos, crescer muito além disso (1,2% a 1,4%), só com aumentos
da produtividade. Que dependem da acumulação de capital físico e humano
por trabalhador, de inovações técnicas e de mudanças nas áreas
previdenciária, trabalhista e tributária”. Ou seja, a qualidade do nosso
ensino volta a ser o centro da questão.
Portanto, educação, ciência e tecnologia chegam ao palco, ao lado de
problemas sociais como as deficiências no saneamento básico (que pensam
nossos candidatos de 35% dos domicílios não estarem ligados a redes de
esgotos?), na limpeza urbana e os mais que graves problemas da
concentração de pessoas nas cidades. Estudo publicado pela revista
Science e mencionado por este jornal (19/9) admite que ao final deste
século se poderá chegar no mundo a 11 bilhões de pessoas, 2 bilhões mais
do que se pensava antes. Continuaremos aqui estimulando a concentração
nas cidades?
E que pensa o Brasil do quadro de concentração da renda e do consumo
nos países industrializados? A campanha eleitoral não entrou por esse
terreno. Continuaremos no papel que nos foi reservado desde o Brasil
colônia – o de exportadores de produtos primários a baixos preços,
convenientes para os países industrializados/consumidores?
Washington Novaes é jornalista.
Fonte: O Estado de S. Paulo.
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