No
domingo passado, no Rio de Janeiro, concluiu-se a Jornada Mundial da Juventude,
evento católico coordenado pelo papa Francisco, que contou com a participação
de milhares e milhares de jovens católicos do mundo inteiro. Ao comentar esse
evento, insisti que esse encontro da juventude deveria despertar em nós a
vocação para sempre nos renovar. No artigo da semana passada, citei a palavra
de Jesus: "é preciso nascer de novo”. Alguém me perguntou: "Renascer
interiormente é algo possível de se aprender?”.
Atualmente,
grupos espirituais ligados a correntes da nova consciência (new age) fazem terapias de renascimento
e, através de exercícios de respiração, afirmam alcançar a consciência de vidas
anteriores e de consciência mais aguda do próprio ser e da missão de cada
pessoa nessa terra. Outras tradições propõem esse caminho de renovação interior
no próprio cotidiano da vida e sem precisar de referências a vidas anteriores
ou futuras.
Em
primeiro lugar, é preciso se dar conta: enquanto todos os animais nascem de uma
vez por todas e, se puderem, vivem de acordo com a sua natureza e seu instinto,
o ser humano é diferente. Seu nascimento é incompleto. Não nascemos totalmente.
A cada momento da vida, temos de enfrentar a fadiga de gerar-se de novo ou ser
gerados. A água é o ambiente perfeito para o peixe. O ar é o espaço feito para
os pássaros, mas nenhum mundo se adapta perfeitamente ao ser humano. Por mais
que nos esforcemos, somos sempre, de alguma forma, incapazes de nos adaptar.
Nenhum sistema consegue nos prender de forma absoluta. Essa é nossa riqueza
maior e, ao mesmo tempo, nosso tormento. Como nunca nascemos totalmente, somos
sempre chamados a criar um mundo novo e a parir incessantemente em nós um ser
novo e no mundo um ambiente que acolha e favoreça essa humanidade renovada.
Alguns
caminhos espirituais, principalmente no Oriente, desiludidos da possibilidade
desse caminho novo, procuram desnascer, ou
seja, anular o nascimento e atingir o nada, em uma espécie de aniquilamento do
eu, fusão no Bhrama eteno e coletivo dos hinduístas, ou no Nirvana budista. No
Ocidente, Maria Zambrano, grande filósofa espanhola do século XX, afirmava: "A
esperança é fome de nascer do todo, de completar aquilo que dentro de nós, de
forma apenas esboçada, carregamos. Nesse sentido, a esperança é a substância da
nossa vida, a sua dimensão mais profunda, como o fundo de um poço. Graças a
ela, somos filhos e filhas dos nossos sonhos, daquilo que não vemos e não
podemos verificar. Assim, confiamos a nossa vida a algo que não existe ainda, a
uma incerteza. Por isso e para isso, temos tempo. Se fôssemos já totalmente
formados e completos, não teria sentido consumir-se nesse esforço”(1).
Essas
palavras da filósofa veem a tarefa do renascimento como esforço humano de
sempre renovar-se interiormente. O Judaísmo, Cristianismo e Islã creem que o
renascimento é pura graça divina que a pessoa recebe pelo amor. Esse
acolhimento supõe uma abertura interior e se expressa através de um esforço
para se viver isso na relação consigo mesmo e com os outros. A pessoa aprende a
renascer interiormente através da solidariedade e do esforço concreto em função
da justiça social e da construção de um mundo novo possível. Quando nos abrimos
ao outro e saímos de nós mesmos para servir e nos consagrar aos outros, dialeticamente
nos encontramos a nós mesmos de forma mais profunda e realizamos essa
construção a qual Jesus se referiu ao afirmar: "Quem quer salvar a sua vida
para si mesmo a perderá e quem aceita perdê-la, por amor de mim, a salvará” (Lc
9, 24).
Fonte: Adital
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