Frei Gilvander Luís Moreira
Frei Carmelita; mestre em Exegese Bíblica; assessor da CPT, CEBI, SAB e Via Campesina
Muitas pessoas têm me perguntado: "Como você analisa a situação da moradia no
Brasil? Você acha que esta questão tem sido tratada com prioridade pelos
governos?” Respondo: Os governos têm sido mais do que
omissos. Têm sido cúmplices da bárbara injustiça que padece sobre milhões de
famílias empobrecidas nas cidades. As grandes cidades estão sendo tratadas como
empresas. Por isso competem entre elas para ver qual atrai mais empreendimentos
do capital. A especulação imobiliária assola as cidades. Muitas áreas ocupadas
pelos pobres há décadas agora passam a ser consideradas áreas de riscos, mas
porque se tornaram áreas de ricos. O que mais ameaça os pobres não são os
riscos geológicos, mas a especulação e os riscos sociais. É um crime que clama
aos céus o imenso déficit habitacional. Há cerca de sete milhões de famílias
sem-casa no Brasil enquanto há cerca de sete milhões de imóveis ociosos e vazios.
Em Belo Horizonte,
por exemplo, falta moradia para mais de 150 mil famílias. Cinco Ocupações
urbanas na capital mineira –Camilo Torres, Dandara, Irmã Dorothy, Zilah
Sposito/Helena Greco e Eliana Silva– construíram (ou estão construindo) nos
últimos anos quase duas mil casas de alvenaria, enquanto o prefeito de Belo
Horizonte, Márcio Lacerda -, que está no PSB, mas é PSDB no DNA - não construiu
nenhuma casa para famílias de zero a três salários mínimos pelo Programa Minha
Casa Minha Vida em quatro anos de primeiro mandato. "Uma pessoa sem casa é como um pássaro sem ninho: voa, voa, mas não tem
onde se assentar”, disse-me uma mãe com lágrimas nos olhos, na Favela
Massari, em São Paulo,
SP.
Injusto também é Minha Casa Minha Vida através de Construtoras. Deveria ser
apenas através de Entidades idôneas que já trabalhavam com os sem-casa. As 20
famílias do Assentamento Pastorinhas, do MST, em Brumadinho, MG, por exemplo,
receberam R$9.700,00 para construir suas casas na agrovila do assentamento.
Reuniram mais uns R$5.000,00 e fizeram 20 casas grandes, bonitas e espaçosas.
Isso demonstra que através de autoconstrução ou em mutirão se pode construir
muito mais casas com pouco dinheiro. No Minha Casa Minha Vida, quem mais ganha
com a construção das casas, via construtoras, são as próprias construtoras.
"Qual
a saída para as famílias que não têm onde morar?”, me perguntam muitos
sem-teto. Respondo: Mágica não existe. Não há saída fácil. Não dá para dar um
jeitinho. O caminho correto a ser trilhado é se unir, se organizar e partir
para a luta coletiva. Dizem que se ficar, o bicho come. Se correr, o bicho
pega.
Mas, se unir, se organizar e partir para a luta, o bicho some. Assim expulsamos os opressores dos pobres. A
experiência das cinco ocupações, citadas acima, demonstra que quase duas mil
famílias, na luta e na raça, se libertaram da cruz do aluguel e da humilhação
da vida de favor. Estão construindo suas casas, na luta, na raça, com garra e
fé no Deus da vida, em si mesmo e nos/as companheiros/as. Quem continuar lutando
sozinho será morto aos poucos. Não nascemos para viver em-pregado, pregado,
pregado, ganhando só um salário mínimo, que é só o sal, para renovar as
energias e continuar sendo sugado pelos capitalistas e pelo deus mercado. Não!
Nascemos para ser livres e emancipados! Ser livre é difícil, mas é necessário e
possível! Jamais os opressores podem libertar os oprimidos. Somente os
oprimidos, em comunhão, se libertam. Temos que fortalecer o sentimento de
pertencimento à classe trabalhadora que é oprimida pela classe dominante.
Outros questionam: "Temos assistido a um aumento da repressão
aos movimentos de moradia e às ocupações urbanas. Por que isso?” Temos que
entender como a Classe dominante se relaciona com os pobres: adora os pobres
enquanto esses estão ajoelhados, de mãos estendidas, se contentando com
migalhas, e, no mundo do trabalho, oferecendo seu suor e sangue para construir
tudo o que existe e movimentar a cidade. Mas quando os pobres se unem, se
organizam, metem o pé no barranco e se rebelam como fez o povo da Bíblia
escravizado pelo imperialismo dos faraós no Egito, como fez Jesus de Nazaré ao
pegar um chicote e expulsar os vendilhões do templo, como fez Zumbi dos
Palmares, Dandara, Gandhy, Luther King, Che Guevara e tantos outros, os
poderosos tremem de medo do seu edifício da opressão se desmanchar como um
castelo de areia. Por isso fazem campanha permanente de difamação,
criminalização e satanização dos pobres e de quem luta ao lado deles. A classe
dominante sabe que precisa criar uma cortina de fumaça que impeça os pobres de
identificar seus reais algozes. Os poderosos sabem muito bem que quando os
pobres se descobrirem como classe social oprimida e identificarem quem, de
fato, são seus opressores, nesse dia, adeus opressão. As vítimas golpeadas pelo
capital não serão mais vistas como pessoas violentas.
Nosso Deus - o Deus solidário e
libertador - está na guia do movimento popular e de todas as forças vivas da
sociedade que conspiram pela construção de uma sociedade que caiba todos e
tudo, se relacionando de forma justa e solidária. Não podemos nos omitir diante
de tantas injustiças. Não incomoda quem fica só consolando, fazendo assistência
social, filantropia. Quem luta por justiça incomoda os poderosos e, por isso,
eles partem para ameaças. A História nos ensina: só faz história libertadora
quem anda na contramão atrapalhando o sábado. Assim aconteceu com Jesus de
Nazaré, com Gandhy, Luther King, Che Guevara, Zumbi, Dandara, as mães da Praça
de Maio, em Buenos Aires etc, mas são esses incompreendidos e perseguidos que
constroem a verdadeira história. Somos milhões conspirando a construção de uma
sociedade socialista, justa e sustentável ecologicamente.
Algumas lideranças me pedem um
conselho: "Que recado você dá para as
famílias sem-teto que estão na luta para conquistar o direito humano de morar
dignamente?” Aconselho: Sintam-se abençoados/as pelo Deus da vida. A luz e a
força divina brilham em vocês! Não desanimem nunca da luta coletiva! Só perde
quem não entra na luta coletiva ou quem desiste da luta! Cultivemos a amizade,
o companheirismo, nos apoiemos mutuamente. Um fraco + um fraco + dois fracos =
quatro fortes. Se ficarmos isolados, pensando só no nosso umbigo, só na nossa
família, morreremos aos poucos, mas se nos juntarmos, construiremos uma nova
aurora, com justiça e paz, com reformas urbana e agrária, com sustentabilidade
ecológica, com direitos humanos.
Fonte: Adital
CEPRO – Um
Projeto de Cidadania, Educação e Cultura em Rio das Ostras.
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Esperança - centro
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