No dia 23 de abril, o
governo federal anunciou um investimento, via ministério da Cultura, de
R$373 milhões na construção e revitalização de bibliotecas; contratação
de agentes de leitura e na realização de feiras e festivais de
literatura. Segundo a chefe da pasta, Ana de Hollanda, “a leitura
não é um ato reflexo, aprendido naturalmente. É resultado de uma
sofisticada operação, aprendida ao longo de anos e que, por isso mesmo,
precisa ser cultivada cuidadosamente, para além dos muros da escola”.
Reconhecer na leitura um raciocínio crítico significa reputar ao
leitor o papel de produtor de sentidos, capaz de romper com os aspectos
superficiais do texto. É quando a atividade ganha outros significados,
conferindo ao sujeito aquilo que os estudiosos chamam de “competência
leitora”. A posição é defendida pela pesquisadora e doutoranda em História da Leitura, Rosária Boldarine. “A competência leitora não é uma qualidade inata. Requer um trabalho árduo que deve ser iniciado na escola”, adverte.
No momento em que o país passa por um desenvolvimento econômico inigualável, com queda nas taxas de mortalidade infantil e aumento dos índices de escolaridade na última década, segundo o Censo 2010 do IBGE – ainda que a passos lentos, e muito distante do alcançado por países ricos –, surge no horizonte o desafio de devolver à leitura o prestígio e a utilidade de outrora.
Pesquisa encomendada pelo Instituto Pró-livro e Ibope Inteligência, a
terceira edição do mapeamento “Retratos da Leitura no Brasil”, mostra
que ler está entre as atividades menos cotadas dos entrevistados. O
total de pessoas que afirmam cultivar o hábito de ler em seu tempo livre
caiu, entre 2007 e 2011, de 36% para 24%.
Outro dado levantado pelo estudo, um dos mais repercutidos, dá conta que 75% dos entrevistados jamais pisaram numa biblioteca.
Para atrair potenciais leitores, as novas bibliotecas a serem
construídas pelo governo estarão situadas em locais que reúnem outras
atividades além da leitura, como é o caso dos telecentros e praças.
Acredita-se que a diversidade de usos possa gerar uma nova circulação
de interesses, aproximando as pessoas dos livros.
Novos Leitores
A formação de novos leitores normalmente acontece pela convivência e pelo estímulo desempenhado por outros atores sociais, tais como a família, demais leitores e até professores.
Segundo a pesquisadora Boldarine, “um leitor dificilmente se forma
sozinho. Inúmeros estudos indicam a necessidade de um mediador no início
da prática leitora”.
Incidem também nos costumes as transformações históricas recentes nos
arranjos familiares tradicionais. “Com a entrada da mulher no mercado
de trabalho, e as novas configurações para a família, as crianças
dificilmente têm em casa um momento para que o incentivo à leitura
ocorra”, avalia Boldarine.
Escola
Formar leitores no ambiente escolar, sujeito a todas as regras da
convivência institucional, ainda é um desafio. “A leitura aparece como
uma forma de controle do professor sobre o aluno”, argumenta a
professora Raquel Lazzari, livre-docente em Didática pela Universidade
Estadual de São Paulo (Unesp). “O aluno passa a atuar como tradutor da
leitura do professor, e não como leitor”, diz.
“Muitas vezes o aluno internaliza o princípio segundo o qual sua
leitura deve ser balizada pelas referências construídas pelo professor”,
alerta Lazzari. Segundo ela, embora as práticas de leitura estejam
vinculadas à escolaridade, é necessário debater como ampliá-las dentro e
fora da sala de aula.
Para Lazzari, é importante criar uma condição favorável para avaliar
as situações em que a leitura ocorre, tais como os critérios ao se
decidir por esse ou aquele texto. “Muitas vezes ensina-se literatura
para aprender Gramática, História ou para redigir melhor. Mesmo obras de
reconhecido valor artístico perdem na escola seu poder de encantamento.
Houve avanços, mas ainda há muito por fazer”, reforça a professora.
Lazzari aponta ainda que a leitura não está destinada apenas a
apreensão de um conteúdo, ou a um estudo. Ela é, antes de tudo, uma
prática cidadã. “Qualquer pessoa que não tenha acesso ao capital
cultural de uma sociedade ‘letrada’ foi roubada em um direito básico de
cidadania. Esse roubo retira a possibilidade de autonomia crítica e de
trânsito pelas instituições legitimadas por essa sociedade”, finaliza.
Fonte: Portal aprendiz
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