Paradoxalmente, se não se atuar com decisão para frear a mudança
climática, a redução das emissões de gases-estufa poderá ocorrer pelo
colapso da economia mundial, alerta neste artigo Maurice Strong.
Pequim,
China, 4 de junho de 2012 (Terramérica).- Aproxima-se a Rio+20, a
Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável que,
entre 20 e 22 deste mês, continuará uma tarefa iniciada há 40 anos,
decisiva para a sustentabilidade global. A primeira conferência mundial
sobre meio ambiente, realizada em Estocolmo em 1972, introduziu a
questão ambiental na agenda internacional.
A preparação passou por
várias dificuldades, entre outras o temor dos países em desenvolvimento
de que a preservação do meio ambiente fosse usada pelas nações ricas
para desviar os recursos e a atenção dos temas do desenvolvimento e da
eliminação da pobreza, para eles prioritários. Os países em
desenvolvimento ameaçaram boicotar a Conferência e reclamaram que os
desenvolvidos lhes concederam novos recursos financeiros em troca de
participar da cooperação ambiental.
Estocolmo foi a primeira
conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) na qual a China
interveio após seu pleno ingresso no fórum mundial, enquanto União
Soviética e outros países comunistas a boicotaram por ter sido impedida a
participação da República Democrática Alemã.
A mudança climática
foi um dos principais assuntos tratados, e desde então passou a ser alta
prioridade para a comunidade internacional, por meio do Programa das
Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). A Declaração de Princípios e
o Plano de Ação aprovados em Estocolmo superaram as expectativas.
Estocolmo levou à criação do Pnuma, em dezembro de 1972. Também
impulsionou a criação de ministérios ou direções de temas ambientais em
muitos países.
Desde o início houve várias tentativas de limitar o
impacto do Pnuma. O Grupo de Bruxelas, formado por Grã-Bretanha,
Estados Unidos, Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e França, foi
convocado – segundo nota escrita por um diplomata britânico – “para
elaborar e concertar políticas de acordo com os pontos de vista dos
principais governos interessados”.
Esses países apoiaram a criação
do Pnuma, mas trabalharam nos bastidores para que não se convertesse em
uma organização influente. Tentaram limitar o apoio financeiro de modo a
ter um pessoal reduzido.
Apesar disso e da localização de sua sede em
Nairóbi, o Pnuma foi capaz de recrutar um pessoal de extrema experiência
e competência. De sua Junta de Coordenação para o Meio Ambiente
participaram os diretores de diversas organizações da ONU, do Banco
Mundial e do Fundo Monetário Internacional, o que era necessário para
tornar efetiva a função de coordenação do Programa. Infelizmente, a
junta foi em seguida substituída por uma comissão de menor nível.
Agora,
a Rio+20 deve apoiar a ascensão do Pnuma à categoria de agência
especializada, o que poderia levar à criação da já proposta Organização
Mundial para o Meio Ambiente. A Rio+20 deve se basear na Carta da Terra.
O
novo rumo reclamado no Rio em 1992 exige mudanças econômicas radicais –
uma verdadeira revolução – que deveriam ser encabeçadas pelos mesmos
países, na maioria ocidentais, que dominaram a economia mundial durante o
período no qual se infligiu um dano acumulativo aos sistemas que são o
sustento da vida na Terra, seus preciosos recursos biológicos e seu
clima. Esses países monopolizaram os benefícios econômicos nesse
período.
A Rio+20 deve reforçar a atenção na biodiversidade
biológica, que é o objetivo da Década da Biodiversidade, e, em
consequência, deve promover ações específicas para proteger os recursos
essenciais para a sustentabilidade global. A experiência ensina que os
países de maior êxito na preservação do meio ambiente também são – como o
Japão – os mais eficientes no manejo de suas economias e na economia de
energia e recursos naturais. A Rio+20 deve aprovar programas especiais
de assistência às nações em desenvolvimento que desejarem elevar a
eficiência de suas economias.
Nada é mais importante para o futuro
humano do que se contrapor à mudança climática. No entanto, a vontade
política para atuar de maneira cooperativa e decidida neste terreno
diminuiu perigosamente. A Rio+20 deve redobrar os esforços para chegar a
um acordo sobre a renovação e aplicação da Convenção Marco das Nações
Unidas sobre a Mudança Climática. Paradoxalmente, se não agirmos, a
redução das emissões globais de gases-estufa poderá ocorrer pelo colapso
da economia mundial.
Seguramente, a crise ambiental e as crises
econômica e financeira têm a mesma origem: as deficiências de nosso
sistema econômico. Apenas uma visão esclarecida de nosso próprio
interesse na segurança e sustentabilidade da vida poderá induzir os
países mais desenvolvidos a aceitarem a responsabilidade que lhes cabe
para realizar as mudanças necessárias. O mundo em desenvolvimento também
deve contribuir, mas suas responsabilidades são de magnitude inferior.
O
conceito de responsabilidades compartilhadas, mas diferenciadas, deverá
ser fortemente reforçado na Rio+20. As crescentes desigualdades no
desfrute dos benefícios do crescimento econômico continuam ampliando a
brecha entre ricos e pobres em todos os países, inclusive na China, a
nação que tirou mais gente da pobreza. Desta forma, é minada a
perspectiva de se permitir que os pobres e os desfavorecidos
compartilhem equitativamente os benefícios do desenvolvimento
sustentável e é fomentado um mal-estar social que se manifesta em todo o
planeta.
Maurice Strong foi
secretário-geral da Cúpula da Terra em 1992 e primeiro diretor-executivo
do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma). Atualmente é
assessor especial do secretário-geral da Rio+20. Direitos exclusivos
IPS.
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de
comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma)
e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service
(IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
Fonte: envolverde
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