Vivemos um período especial da história. Nos próximos 20 a 30 anos, a
humanidade terá de fazer escolhas inéditas sobre o futuro que desejará
ter, quais os valores que serão passados para as próximas gerações, como
produzir e consumir, e como deixará o planeta para a sobrevivência de
seus semelhantes e descendentes.
A atual escassez de lideranças, seja nos níveis local, regional ou
global, deve ser uma preocupação, pois, por meio delas é que seria
possível enfrentar as crises ecológica e ambiental, que já começam a
causar graves consequências sociais (tempestades, inundações, furacões,
estiagens prolongadas, etc) em todo o mundo. Sem falar nas guerras e
sérios conflitos armados entre países, diante dos quais as estruturas
das Nações Unidas se mostram frágeis.
Estas observações foram feitas por Sérgio Besserman, economista,
ambientalista, professor de economia da Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro (PUC/RJ), ex-diretor do Banco Nacional de
Desenvolvimento Social (BNDES), ex-presidente do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) e membro do Conselho Diretor da WWF
Brasil, na palestra proferida na quarta-feira, 30 de julho, no segundo
dia do Seminário Sebrae de Sustentabilidade em Cuiabá.
O tema da palestra foi “Liderança e Gestão Sustentável”. Cerca de 350
pessoas estiveram presentes no Centro de Eventos do Pantanal. Desde a
Revolução Industrial, os hábitos e o modo de vida da sociedade humana
mudaram totalmente, disse Besserman. Se por um lado se passou a viver
mais, devido ao desenvolvimento científico que gerou antibióticos e
vacinas, por outro a produção industrial e o consumo cresceram
velozmente, especialmente no século 20, sem considerar o ritmo da
natureza para repor os recursos naturais (matérias primas).
A ciência econômica não se preocupava com o capital natural e o
tratava como bem infinito, até que por volta da segunda metade do século
20 os cientistas começaram a apresentar estudos sobre o ritmo
insustentável do crescimento econômico e da população mundial.
Questão social
Para Besserman, as populações menos favorecidas são as que mais
sofrem os efeitos do desequilíbrio ambiental e consequências como o
aquecimento global e a falta de água. As mudanças climáticas, que devem
provocar o aumento da temperatura na Terra em 2 graus, nos próximos
anos, e a extinção acelerada de espécies são sinais de muitos problemas
pela frente.
Para a economia, é certamente uma grande preocupação, pois as
matérias primas serão cada vez mais caras, escassas e os processos
produtivos terão de se tornar muito mais eficientes. Ficará muito mais
difícil ser competitivo e ter um negócio sustentável.
“Os economistas se esqueceram de que não existe almoço grátis”, disse
Besserman, brincando. “Achamos que podíamos usar os recursos naturais
sem se preocupar, que nunca iam faltar. Pensávamos que seria possível
sempre substituir capital natural por capital humano, que a tecnologia
resolveria tudo. Era uma ideia imbecil, fruto da onipotência narcísica
do homem”, disparou.
Perdendo a guerra
O palestrante citou as grandes conferências da ONU sobre meio
ambiente e desenvolvimento sustentável – Estocolmo (1972), Rio-92 e
Rio+20 – como marcos dos debates mundiais sobre o tema. Ele lamenta que
apesar das informações, dos alertas dos cientistas, dos estudos que
apontam os perigos do aquecimento global e da extinção acelerada das
espécies, países, governos e mercado continuam encarando devagar os
problemas.
“Estamos longe de ganhar esta guerra”, enfatizou Besserman. Ele se
referiu ao estudo Limites da Terra, da Universidade de Estocolmo de
2009, segundo o qual doze limites do planeta estão sendo ultrapassados.
Três deles e mais graves são: escassez de nitrogênio no solo, mudanças
climáticas e crise da biodiversidade.
Tempos distintos
Segundo geólogos, os impactos que a humanidade está promovendo e
possíveis consequências equivaleriam a cinco dos maiores apocalipses da
história, citou o economista. “No nosso curtíssimo tempo de existência,
estamos provocando uma severa crise na natureza”, resumiu.
O tempo da natureza e do cosmos é outro e não significa que o homem
vai destruir o planeta, acrescentou. Estamos dificultando o futuro e a
nossa própria sobrevivência. Em termos de oportunidades para os
negócios, Besserman falou que nos próximos dez a vinte anos, haverá uma
janela pequena de escolhas. O momento de tentar recuperar o que foi
perdido já se foi. De agora em diante, resta procurar se adaptar e ser
recipiente às mudanças que vão ocorrer. As principais consequências
serão sentidas na agricultura, nas cidades e na saúde.
As grandes empresas estão estudando as mudanças climáticas e
planejando seus negócios e investimentos de acordo com as previsões de
temperatura e transformações de culturas e processos produtivos. Os
pequenos negócios precisam se preparar também. “Vamos escolher continuar
a fazer negócio como fazemos e deixar a temperatura do planeta subir
até 6 graus ou vamos mudar tudo?”, provocou Besserman.
Taxação dos serviços
Ele finalizou a palestra sugerindo a inserção do custo do aquecimento
global nos produtos e serviços. “Não tem outra saída. Consumo
consciente é bom para resolver o atrito, mas preço é o que resolverá”,
ressaltou.
Para o economista, ao pagar pelo custo do aquecimento do planeta,
consumidores e empreendedores iriam exigir que lideranças regionais,
nacionais e globais surgissem e atuassem contra as mudanças climáticas e
a crise da biodiversidade de maneira concreta. “A crise ecológica e
ambiental causará problemas humanos principalmente para os mais pobres.
Será uma crise social”, profetizou.
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